
Entre os símbolos mais reconhecíveis do cinema de terror moderno, poucos são tão inquietantes quanto Annabelle. Essa boneca de porcelana de olhar fixo e sorriso quase imperceptível conquistou um espaço próprio dentro do universo cinematográfico criado por James Wan. Desde sua primeira aparição em Invocação do Mal (2013), ela deixou claro que não era apenas um objeto decorativo, mas um catalisador para o mal. Em Annabelle 2: A Criação do Mal, lançado no Brasil em 17 de agosto de 2017, o público finalmente descobre a origem sombria dessa entidade.
O filme, dirigido por David F. Sandberg, chega como prequela do longa Annabelle (2014), mas surpreende ao ser mais eficiente, intenso e elogiado que o seu antecessor. Mesmo quem não assistiu ao primeiro consegue compreender a trama por completo, enquanto os fãs da franquia encontram diversas conexões e pistas que enriquecem a narrativa. Essa combinação de acessibilidade e continuidade é um dos fatores que tornam o filme tão interessante.
Para quem nunca ouviu falar do universo Invocação do Mal, vale um breve resumo. A franquia é composta por filmes que narram casos sobrenaturais inspirados, em parte, nos arquivos de investigações de Ed e Lorraine Warren, um casal de demonologistas famosos. Ao longo dos anos, as histórias se ramificaram em produções próprias, como A Freira, A Maldição da Chorona e a trilogia Annabelle, formando um conjunto de tramas interligadas. Embora nem todos os filmes tenham os Warrens como protagonistas, todos compartilham elementos e acontecimentos que se conectam em uma linha cronológica maior.
O Nascimento de uma Lenda

A narrativa de A Criação do Mal começa apresentando Samuel Mullins (Anthony LaPaglia), um artesão renomado por criar bonecas detalhadas e realistas. Ao lado de sua esposa, Esther (Miranda Otto), ele vive uma vida simples até que um acidente trágico tira a vida de sua filha, Bee. Devastados pela perda, eles se isolam do mundo. Anos depois, decidem oferecer abrigo a uma freira, Irmã Charlotte (Stephanie Sigman), e um grupo de meninas que ficaram desalojadas após o fechamento de seu orfanato.
À primeira vista, a grande casa dos Mullins parece um refúgio seguro, mas a presença de um quarto trancado e as regras rígidas sobre não entrar nele despertam a curiosidade das crianças. É nesse ponto que o filme introduz Annabelle de forma marcante. A boneca, guardada dentro de um armário trancado e forrado com símbolos religiosos, não é apenas um objeto inanimado. Ela serve como recipiente para uma entidade demoníaca que deseja se libertar e se aproximar de suas vítimas.
Para quem não conhece a franquia, essa explicação é crucial: Annabelle não é “possuída” no sentido tradicional, como se tivesse uma alma própria. Ela é um condutor. O demônio que a utiliza se apresenta como algo inofensivo para ganhar a confiança de suas vítimas, especialmente as mais vulneráveis. Esse conceito foi levemente abordado em Invocação do Mal, mas é aprofundado aqui, revelando como o luto e o desespero dos Mullins os levaram a aceitar qualquer possibilidade de rever a filha – mesmo que isso significasse abrir um portal para algo impensável.
O diretor David F. Sandberg demonstra habilidade ao manter a tensão constante. Diferente de filmes que dependem apenas de sustos repentinos, aqui a tensão é construída lentamente, explorando sons distantes, silêncios prolongados e a sensação de que algo está sempre observando. A casa, com seus corredores estreitos, portas que rangem e quartos pouco iluminados, funciona quase como um personagem, amplificando a atmosfera sufocante.
Outro elemento interessante é a presença da Irmã Charlotte, que, além de cuidar das meninas, serve como ponto de ligação para outros filmes da franquia. Sua fé é testada a cada evento sobrenatural, e seu papel vai além do que parece inicialmente. Para os fãs atentos, sua ligação com A Freira é um presente que reforça a coesão do universo Invocação do Mal.
O maior trunfo de A Criação do Mal está em como ele supera o filme anterior da franquia Annabelle. Enquanto o longa de 2014 foi criticado por se apoiar em clichês previsíveis, esta prequela investe em um enredo mais consistente, na construção de suspense e em personagens bem trabalhados. A história foca especialmente em Janice (Talitha Bateman), uma menina que vive com sequelas de poliomielite e se locomove com dificuldade. Essa condição física a torna particularmente vulnerável, algo que a entidade demoníaca logo percebe e explora.
Para quem acompanha a franquia, a transformação de Janice é um detalhe fundamental. Após ser manipulada e possuída, ela foge da casa dos Mullins e acaba sendo adotada por uma nova família, assumindo o nome Annabelle Higgins. Anos depois, ela se torna a jovem que, já adulta, dá início aos eventos de Invocação do Mal. Essa conexão, embora sutil, é um dos elementos que mais agradam aos fãs que apreciam encontrar pontes entre diferentes filmes.
O elenco entrega atuações sólidas. Stephanie Sigman transmite credibilidade como Irmã Charlotte, equilibrando coragem e vulnerabilidade. Lulu Wilson, no papel de Linda, é carismática e traz momentos de leveza, mesmo em meio ao horror. Já Anthony LaPaglia apresenta um Samuel Mullins abatido e consumido pela culpa, enquanto Miranda Otto entrega uma Esther marcada física e emocionalmente pela tragédia.
O design de produção é outro destaque. Ambientado nos anos 1950, o filme reproduz com autenticidade figurinos, objetos e cenários da época. Essa escolha não é apenas estética; ela contribui para a imersão do público e reforça a sensação de isolamento, já que naquele período não havia tecnologias modernas para pedir ajuda rapidamente. Além disso, a iluminação é trabalhada para criar contrastes marcantes, tornando cada sombra potencialmente ameaçadora.
É impossível falar do filme sem mencionar a influência de James Wan como produtor. Conhecido por criar narrativas interligadas de forma orgânica, Wan garante que mesmo as histórias paralelas mantenham a essência do universo maior. Isso significa que, embora A Criação do Mal funcione sozinho, ele também serve como uma peça importante de um quebra-cabeça mais amplo.
Recepção e Críticas

Ao contrário do primeiro filme de Annabelle, que teve recepção morna, A Criação do Mal foi bem recebido pela crítica e pelo público. No Rotten Tomatoes, acumula 70% de aprovação, com destaque para a direção de Sandberg e a capacidade do filme de provocar medo genuíno. O consenso crítico aponta que, além de ser uma adição sólida à franquia Invocação do Mal, o longa prova que bonecas assustadoras continuam sendo uma aposta segura para o terror.
No Metacritic, a pontuação foi de 62/100, indicando críticas geralmente favoráveis. Muitos elogios se concentraram no ritmo, na ambientação e na forma como a narrativa respeita a inteligência do público, evitando explicações exageradas e permitindo que o suspense seja absorvido gradualmente.
Do ponto de vista comercial, o filme também foi um sucesso, arrecadando significativamente mais que seu orçamento. Esse desempenho reforçou a confiança da Warner Bros. em continuar investindo em histórias derivadas do universo Invocação do Mal.
O que diferencia A Criação do Mal de outros filmes de terror contemporâneos é a atenção aos detalhes e o cuidado na construção da atmosfera. O terror aqui não é apenas visual, mas psicológico. As expressões de medo genuíno das crianças, os diálogos carregados de tensão e a ausência de música em momentos-chave criam uma sensação de desconforto crescente.
Outro ponto relevante é a forma como o filme lida com a fé e o desespero. O luto dos Mullins é explorado como porta de entrada para o mal, mostrando como sentimentos humanos profundos podem ser manipulados por forças malignas. Essa abordagem não apenas dá mais profundidade aos personagens, mas também levanta reflexões sobre até que ponto as pessoas estariam dispostas a ir para aliviar sua dor.
Além disso, A Criação do Mal consegue entregar sustos eficazes sem depender excessivamente de jumpscares previsíveis. O uso do som é inteligente: passos em corredores, portas se fechando sozinhas e sussurros ao fundo são recursos usados para aumentar a imersão.
Annabelle 2: A Criação do Mal é mais do que uma simples história de boneca amaldiçoada. É um filme que combina narrativa envolvente, personagens bem desenvolvidos, ambientação autêntica e uma conexão consistente com um universo cinematográfico maior. Ao mesmo tempo, é acessível para novos espectadores e recompensador para fãs dedicados.
Mesmo sem assistir ao primeiro Annabelle, o público consegue acompanhar a trama, enquanto aqueles que conhecem a franquia percebem as costuras que ligam cada obra. Ao transformar um objeto aparentemente inofensivo em símbolo de medo, o filme reforça a ideia de que o terror mais eficaz nasce daquilo que parece familiar – mas que, com um simples olhar, se revela profundamente ameaçador.
Agora é com você: Qual cena de A Criação do Mal mais te arrepiou? Você percebeu outras conexões com o universo Invocação do Mal que não comentamos aqui?
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